sábado, 23 de março de 2013

Confrarias de Penitentes: o desfile da Quaresma.

Pe. Manoel Henrique de Melo Santana

Foi em Barbalha, cidade vizinha do Juazeiro do Ceará, que conduzidos pelo saudoso Padre Murilo, fomos conhecer um grupo de penitentes, todos paramentados de preto. No Brasil durante a Semana Santa, a televisão tem apresentado cenas de penitentes até se auto lacerando. Em Alagoas, os índios da tradição Pankararu utilizam-se de urtiga para se penitenciarem em seus rituais de Quaresma.

A Semana Santa tem o seu ponto culminante na Sexta-feira Santa, apesar de a Liturgia cristã apontar para o Domingo da Páscoa. Em Portugal, as faixas roxas descem e adornam sobriamente as Igrejas, os sinos silenciam para funcionarem as matracas. Várias Igrejas da Arquidiocese Primaz de Braga celebram desde 1710 a adoração eucarística do Lausperene Quaresmal, com decorações feitas de flores, velas e monumentais cortinas, em contraste com rigor litúrgico do tempo quaresmal. O Descimento de Jesus da cruz é um dos momentos mais importantes da cerimônia, seguida pelo sermão do “Senhor Morto”. Um texto português de Braga trazia a seguinte quadra popular, publicada pelo Abade de Baçal, sobre as cores litúrgicas:” Ando vestida de preto/ ou de roxo como o lírio,/ Mas ninguém me morreu:/ é de luto por quem está vivo”. Esta é uma questão muito séria entre nós, que toca à Teologia, que não sabe explicar o mistério da Morte de Jesus. Segundo Vivaldo Coaracy, do Rio de Janeiro, a Semana Santa envolvia a cidade em atmosfera pesada de luto e melancolia. Sobre o povo caía um opressivo silêncio, sem músicas ou gritos. Tudo convergia para o trágico, o triste, o doloroso, o deprimente da Paixão e Morte de Nosso Senhor e tudo então terminava com o seu enterro. Havia também a Madalena, convertida, que levava um vaso de bálsamo para ungir os pés do Senhor, como está no Evangelho. A Procissão para por um momento e entra em cena Verônica, cantando “O vos omnes”, que desenrrolando um pano o rosto ensanguentado de Jesus está impresso, mostrando-o ao povo. Na chegada da Procissão à Igreja está a Soledade de Nossa Senhora, na frente da Igreja. O corpo desfalecido de Jesus é entregue à sua Mãe, corajosamente ali presente, cena que mereceu uma obra prima “La Pietá”, do gênio Michelangelo. O espírito ascético da Quaresma conduziu ao aparecimento de grupos penitentes, que se flagelam publicamente.
Na noite Sexta-Feira Santa, em Portugal, aconteciam a Procissão de Endoenças, a Procissão dos Painéis, a Procissão de Santa Maria, a Procissão do “Ecce Homo” ou do Senhor da Cana Verde e a Procissão dos Fogaréus. Nesta noite, os penitentes públicos eram perdoados, prática que durou até o século XIV, quando tudo então passou para a Quinta-Feira Santa. Abolida a reconciliação dos penitentes públicos, organizaram-se então, as Procissões de Penitência, com homens e mulheres flagelantes ou simplesmente penitentes, autoflagelando-se a si próprios e aos outros com cordas e objetos de ferro, confessando seus pecados em voz alta.. Outras pessoas traziam caixas de marmelada, em fatias, para serem oferecidas aos penitentes enfraquecidos, bem como água para beberem. Mais adiante encontravam-se os “físicos”, que cuidavam das chagas dos penitentes, lavando-as com vinho. No século XVI, formaram-se as célebres Confrarias de Penitência, apesar de já conhecidas desde o século XII. Por causa de abusos praticados, o Papa Clemente VI aboliu, no século XIV, a cerimônia dos flagelantes.

Em Congonhas do Campo, Minas Gerais, um espaço foi dedicado à contemplação da Paixão de Cristo, nas obras do imortal Aleijadinho, em fins do século XVIII. Cerca de 66 estátuas, especialmente de Cristo, estão ali expostas revelando-nos expressões de inocência como vítima da crueldade dos soldados. Na Capela dos Passos, o Cristo está com um olhar distante, em atitude de entrega, com uma expressão de fatalidade. Aleijadinho, como parte numerosa dos cristãos, acreditam que Jesus precisava morrer para cumprir o que os profetas haviam predito.

Em algumas Igrejas de Alagoas existem as chamadas imagens da Paixão, que, nesse dia, deveriam ficar expostas ao público, com as devidas informações bíblicas e comentários artísticos, justificando desta forma a sua existência no passado e hoje. Os fiéis têm necessidade de visibilizar sua fé. Tão verdade é isto que em muitos lugares se preparam encenações da Paixão e Morte de Jesus. Arapiraca é um exemplo maior destas iniciativas populares, de tanta valia para todos em sua fé. Em Fazenda Nova, a Globo tomou conta do espetáculo da Paixão. Como teatro é perfeito, mas falta-lhe o clima de fé, que poderia ser assumido pelas Igrejas, evitando o comércio tão variado de tudo em derredor daquele espaço tornado sagrado pelo tema ali desenvolvido.

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