segunda-feira, 4 de abril de 2011

Carta do Padre Leonardo: rezemos por santos sacerdotes como ele (e para termos alguns mais como ele)!

Apresentamos a carta enviada em janeiro deste ano pelo Reverendíssimo Padre Leonardo Holtz a Dom Orani João Tempesta, arcebispo metropolitano do Rio de Janeiro. Agradecemos ao Padre Leonardo o envio para divulgação e a confiança depositada neste site: http://fratresinunum.com/2011/04/04/carta-do-padre-leonardo-holtz-a-dom-orani-joao-tempesta/#comment-20229

* * *

Excia. Rev.ma

Dom Orani João Tempesta, O.Cist.,

Arcebispo do Rio de Janeiro

Pax!

“É, porventura, o favor dos homens que eu procuro, ou o de Deus? Por acaso tenho interesse em agradar aos homens? Se quisesse ainda agradar aos homens, não seria servo de Cristo.” (Gl 1,10)

Há muito que desejo dirigir a V. Excia. estas palavras, mas não julguei ter ainda chegado a hora. Sei que V. Excia. já tem muitos assuntos com o que se ocupar e lamento profundamente ter que trazer mais um peso a V. Excia., contudo, era necessário que eu o fizesse, pois o que está em jogo é a minha vocação Sacerdotal e, até mesmo, a minha fé católica e a eterna salvação de minha alma. Afinal, “de que vale ao homem ganhar o mundo inteiro, mas perder a sua vida?” (Mt 16,26)

D. Orani, preciso deixar a Arquidiocese do Rio de Janeiro e, desta vez, será definitivamente. Peço que V. Excia. não me julgue sem conhecer meus motivos.

Tenho atualmente trinta anos de idade e seis de ministério Sacerdotal. Vejo com clareza e profunda tristeza a terrível crise que se instaurou na Santa Igreja e, principalmente, no clero de uma forma geral. A disciplina eclesiástica foi deixada de lado e o que vigora hoje é um relativismo que arrefece a fé. Perdemos fiéis, as vocações estão diminuindo… por quê? Simples: porque o jovem deseja encontrar na vida religiosa aquilo que ele não encontra na vida secular. Mas hoje se vê os religiosos agindo como os seculares, então, muitos jovens chegam à seguinte conclusão: não preciso ser um religioso para fazer o que os religiosos de hoje em dia fazem! Por que muitas congregações religiosas de hoje não tem mais vocações? Vamos culpar os “tempos modernos”? Vamos dizer que “os jovens de hoje não querem mais compromisso” como os jovens de outrora? Por que nossas paróquias e santuários estão repletos de fiéis nas missas (especialmente nas missas-show), mas as pastorais estão vazias? Por que nossos fiéis não sabem mais o catecismo? Por que as quadras de samba e as praias estão muito mais bem freqüentadas do que nossas paróquias? Creio que muitos saibam as respostas dessas perguntas, mas muito poucos tem a CORAGEM de admitir, pois é muito mais confortável colocar remendos do que derrubar tudo e reconstruir.

Ingressei no Seminário Arquidiocesano de São José aos 12 dias do mês de Fevereiro de 1997. Tinha acabado de completar 17 anos no dia anterior. Recebi a investidura da batina uma semana antes de Cinzas. Que dia feliz! Recebemos a batina numa cerimônia bonita que foi feita pelo padre Reitor, mas logo que acabou a cerimônia tivemos que tirá-la e guardá-la no armário. Sempre me faço uma pergunta: Exatamente para que o nosso Seminário mantém uma cerimônia de recepção de batinas, se ninguém pode usá-la depois como seu hábito cotidiano e sim como um paramento ocasional? Sabe, D. Orani, eu sempre gostei de vestir minha batina. Sei que eu não era muito bem visto no seminário por causa disso. Eu não usava batina direto dentro do seminário, em parte para não causar problemas com meus superiores, e em parte por escrúpulo e respeito humano. Há muitos que dizem o famigerado bordão “o hábito não faz o monge”, o que é uma bela desculpa para a indisciplina dos padres de hoje. O mais interessante é que não vemos uma muçulmana sem a burca, ou uma “mãe-de-santo” sem seus trajes ou mesmo um militar em serviço sem seu uniforme, mas nossos clérigos insistem em se apresentar como leigos. É claro que se nem os padres dão o exemplo, como os fiéis vão poder se portar bem? Tenho que suportar as mulheres mal vestidas, os decotes e mini-saias dentro da igreja. Isso para não falar que destruíram o piedoso uso do véu. Reina a vaidade! Os homens não ficam atrás. Deus sabe como tenho vontade de negar a Santa Comunhão aos homens que vem de bermuda à Igreja. A Santa Batina é o manto sagrado de Nosso Senhor que nos protege de muitos males, sem falar que para nós, religiosos, ela é um constante lembrete de nossa consagração e um excelente exercício da virtude da humildade e de mortificação. Nosso Senhor já dizia: “o espírito está pronto, mas a carne é fraca” (Mt 26, 41). Quanto bem a batina pode fazer ao sacerdote! Um sacerdote de batina necessariamente vai ponderar melhor seus atos; não pode freqüentar todos os ambientes; deve conter os olhares curiosos, as palavras ociosas, as excessivas familiaridades. Ele deve portar-se bem SEMPRE, pois, carrega consigo a Imagem da Igreja, Esposa do Cordeiro, sem ruga e sem mancha. Depois do Concílio foi feito um trabalho de “destruição” da imagem do sacerdote. Querem convencer os católicos (e o mundo inteiro) de que o padre é um homem comum e que, portanto, deve se vestir como um homem comum. Disseram-me no seminário certa vez que o Concílio permitiu que os padres tirassem a batina para “facilitar o ministério pastoral, pois vestindo uma veste comum, isso facilitaria a entrada do padre em ambientes hostis à fé para que lá ele pudesse exercer o apostolado”. Quanta ingenuidade (para não dizer leviandade)! Que sutil armadilha do demônio! Se isso fosse verdade as praias, as boates, casas noturnas masculinas (gls), as casas de show eram para estar mais que evangelizadas! Que diriam os jesuítas europeus que enfrentaram o calor, a mata, os mosquitos e outros contratempos na evangelização da América Latina? E sem tirar seu hábito! Por acaso eles ficaram nus para “dialogar” com os índios? Depois nós “choramos o leite derramado” quando surgem os escândalos que mancham e envergonham o nome da Santa Igreja. De que adianta Sua Santidade, Bento XVI, pedir perdão às vítimas dos abusos de pedofilia se ele, que tem o poder das chaves, não impõe uma disciplina mais rígida aos padres e não exige uma seleção mais severa e uma formação mais sólida nos seminários? Será que se esses padres recebessem uma boa formação, se alguém lhes tivesse falado de sacrifício, mortificação, vida espiritual, se alguém tivesse ensinado a eles que o ministério que receberam é sublime demais e que eles, sem ser diferentes dos demais homens, não são exatamente iguais, será que teríamos tantos escândalos? É triste, D. Orani, mas hoje temos de tudo: padres cantores, psicólogos, jornalistas, artistas, mas temos poucos padres PADRES! Encontramos padres em todos os ambientes hoje, mas, se bobearmos, só não os achamos nas paróquias. Soube que existe um padre que não rezava a Missa da primeira sexta-feira do mês em sua paróquia; as senhoras do Apostolado da Oração para obrigá-lo a rezar a Missa, fazem uma “vaquinha” todo mês e lhe dão uma espórtula. Isso porque ele afirma que só celebra durante a semana se houver intenções marcadas. Mas, mediante uma espórtula, abre-se uma exceção. Não vou consertar o mundo, Excelência, mas fico perplexo com tanta hipocrisia!

No meu segundo ano de seminário, eu estava retornando da minha pastoral dominical e estava usando minha batina. Encontrei-me na rua com um padre formador. O cumprimentei. Ele me olhou, mas não acenou e nem fez o menor sinal de retribuição. Quando cheguei ao seminário, recebi um recado de que o próprio queria me ver. Fui até o padre e ele me segurou pelo braço, com agressividade e, me machucando, perguntou por que eu estava de batina na rua. Me disse coisas horríveis, disse-me que eu gostava de “aparecer” e que eu era um “carreirista”. Que atitude paternal, não? Digna de um formador de seminário! Um homem emocionalmente desequilibrado, metido a psicólogo, com uma psicologia de porta de banheiro, formando os futuros padres da nossa Arquidiocese! E pior: esse senhor, ainda por cima, é um herege! Ele afirmava com todas as letras que a Santa Missa é apenas um “culto de louvor” e não um sacrifício. Certa vez, após o ofertório, ele disse: “Orai irmãos para que o nosso culto de louvor seja aceito por Deus Pai todo-poderoso”, eu me levantei me retirei da capela na mesma hora. Ele foi atrás de mim logo depois para me perguntar por que eu saí da capela no meio da Missa. Eu respondi: “Não, padre, eu não saí no meio da ‘Missa’, mas sim no meio do ‘culto de louvor’. Se fosse a Missa eu teria ficado na capela”. O mesmo sacerdote afirmava também que os Sacramentos não são sete, mas que são muito mais. Quando ele afirmou isso em sala de aula eu, perplexo, levantei a mão e perguntei: “mas se o senhor perguntar na prova e eu responder o que eu aprendi no catecismo, que os sacramentos são SETE, o senhor vai me descontar pontos?” Ele mandou que eu me retirasse da sala de aula.

Sempre ouvia as histórias de minha avó que dizia que no tempo dela a Missa era em latim e que o padre ficava de costas aos fiéis, mas eu não tinha a menor noção do quanto tinham mudado a Santa Missa. Na minha cabeça pueril tratava-se apenas de uma questão estética e lingüística. Como eu estava enganado! Esse assunto no seminário era uma espécie de TABU. Simplesmente não se falava. Foi, então, numa bela tarde que a Graça Divina me conduziu à biblioteca do seminário e ali encontrei um belo livro vermelho, grande, antigo e a lombada trazia em dourado as palavras MISSALE ROMANUM. Pesquisei um pouco, mas não reconheci aquela Missa. Por isso, retirei o Missal e o levei direto ao meu diretor espiritual para fazer algumas perguntas. As únicas respostas que obtive foram: “Sim isso é um Missal antigo” e, logo depois, “coloca aonde você pegou”. Encontrei na mesma sessão os breviários, os rituais e fiquei encantado. Mas afinal, porque a Missa tinha mudado? Por que tudo aquilo estava ali abandonado? E comecei a pesquisar cada vez mais. Mas, quando alguém percebeu meu repentino interesse (e o de alguns outros colegas) pelos livros tradicionais, misticamente, um belo dia, a estante inteira DESAPARECEU. Ainda assim conseguimos salvar um antigo breviário com o qual eu e mais dois rapazes nos reuníamos à noite (escondidos) para rezar as Completas no rito de S. Pio V, com medo de sermos vistos como se estivéssemos fazendo algo proibido ou vergonhoso. Fico muito triste de constatar que hoje se fala tanto em “liberdade religiosa” e de “diálogo”, mas quando se fala em Concílio de Trento aí todo o diálogo desaparece. Há uma profunda aversão a tudo o que é antigo; há uma sede insaciável de novidade.

Outra coisa que me deixava furioso dentro do seminário era aquela SEMANA DE ORAÇÃO PELA UNIDADE DOS CRISTÃOS. Sempre achei isso uma aberração! Como pode um bando de protestantes hereges serem convidados a pregar dentro de um seminário católico? O mais engraçado da história (para não dizer ‘trágico’) é que se retirava o Santíssimo Sacramento do Sacrário e as imagens de Nossa Senhora e S. José também iam parar na sacristia. Mas se o protestante está vindo na MINHA CASA eu tenho que tirar as imagens e o Santíssimo Sacramento por que? Eu preferia, nessas ocasiões, me retirar e ficar no meu quarto a presenciar aquilo. Não entendo o ecumenismo. Não o entendo por que isso NUNCA nos levou a lugar algum! Diziam que essa postura iria ajudar a trazer os hereges e os apóstatas à verdadeira fé, mas o que temos visto é mais e mais apostasia. Quantos fiéis não abandonaram a fé e se uniram a essas seitas? Contra fatos não há argumento e o FATO é que após o Vaticano II e seus movimentos ecumênicos as seitas triplicaram como um estouro da boiada!

Também me incomodava o fato de que leigos estudavam filosofia e teologia com os seminaristas; mulheres participavam da vida cotidiana dos seminaristas… muito impróprio. E os “passeios” das turmas e as “convivências” em Itaipava? Eram ótimas ocasiões onde os seminaristas mostravam REALMENTE quem eram; as músicas que se ouviam, as letras que se cantavam, as palavras ociosas, as brincadeiras nem sempre inocentes e sem segundas intenções… ali já estava um retrato do clero que viria depois: gente que tem SIM suas qualidades humanas, mas que não receberam uma formação que os ajudasse a se exercitar nas virtudes que um sacerdote deve ter. Tinha colegas que ficavam inquietos e impacientes nas Missas, ofícios e outras orações na capela do seminário. Alguns resmungavam (de forma audível) torcendo para que os ofícios terminassem logo. Nunca entendi bem aquilo. Se a pessoa não gosta de rezar, se tem pressa que o ofício termine, vai ser padre pra quê?

Não sou nenhum santo, D. Orani, mas sempre tive consciência da grandeza que é o ministério Sacerdotal, mesmo quando dava meus passos errados. Ainda os dou muitas vezes, mas me confio no Sacramento da Confissão e nos exercícios de mortificação e luto para tentar ser um sacerdote santo.

Em 2001 fui Ordenado Diácono por Dom Eusébio, mas sempre tive o desejo de ser Ordenado no Rito Tradicional. Dom Eusébio sabia disso, pois eu mesmo disse a ele. Como naquele período as negociações entre Campos dos Goytacazes (RJ) e a Santa Sé tinham acabado de acontecer, fui a Campos conversar com Dom Fernando Arêas Rifan, bispo da Administração Apostólica Pessoal S. João Maria Vianney. Tinha intenção de pedir transferência para a Administração Apostólica. Mas voltei de lá muito triste, na verdade, decepcionado! Dom Rifan me disse: “É melhor o senhor ficar onde está. Quem sabe com o seu pensamento tradicional o senhor não possa ser uma influência positiva para o clero carioca?” (Sic!) Não entendia como ele podia rejeitar um padre tradicional já que havia tão poucos.

Bem, como Diácono, ninguém podia me impedir de usar a batina em tempo integral, afinal eu já era oficialmente um clérigo. Mas D. Eusébio me chamou para conversar e me pediu que eu a tirasse. Tentei argumentar com o Cânone 284, mas, ainda assim, ele mandou que eu tirasse a batina para “ficar igual aos outros”. É claro que, por obediência, eu a retirei. Dom Eusébio ainda me disse que eu deveria ter algum problema de ordem psicológica e determinou que eu fizesse sessões de terapia com Dom Wilson Tadeu Jönk, que é psicólogo, o que foi, obviamente, uma grande perda de tempo tanto para mim, quanto para o bispo. Sempre no final das sessões, deixávamos marcada a próxima. Certa vez Dom Wilson marcou numa terça-feira de carnaval. Eu disse a ele “Mas é uma terça de carnaval!” e ele me respondeu: “Eu não vou sair no bloco, você vai? Se não vai, então não vai encontrar problemas de vir até o palácio”. Todo mundo que me conhece sabe como eu detesto sair à rua nos dias de carnaval, primeiramente por medo da violência e depois porque as pessoas me vêem de batina e pensam se tratar de uma fantasia ridícula de carnaval. Mas eu fui assim mesmo. NUNCA vou me esquecer desta cena: cheguei ao palácio e Dom Wilson estava numa salinha do segundo andar com as pernas apoiadas numa mesinha de centro assistindo TV. Tinha se esquecido por completo do nosso encontro e disse que não era um dia apropriado para fazer isso, que eu deveria ter me enganado. Senti-me muito humilhado, mas ofereci isso como sacrifício a Nosso Senhor pela conversão do clero (dele em especial). Tanta gente fazendo coisa errada (desvio de dinheiro, problemas morais seríssimos) e o arcebispo perdendo tempo com um diácono só porque ele queria ser um padre que reza a Missa de Trento? Francamente! Nosso Senhor estava absolutamente certo quando disse: “Guias cegos! Filtrais um mosquito e engolis um camelo.” (Mt 23,24)

Fui Ordenado Sacerdote em 17 de Abril de 2004. Fui logo de cara enviado como coadjutor numa paróquia onde o pároco era muito grosseiro com o povo e os fiéis tinham se afastado em sua maioria. A desculpa dada era “porque ele era velho”. Então todo velho tem que ser grosseiro e mal-amado? Ele queria a todo custo que eu imitasse os abusos que ele introduzia na Missa (ele tinha mania de apagar as luzes da igreja e acender uns holofotes coloridos na hora da consagração) ao que eu disse: “reze a Missa do jeito que o senhor quiser, mas eu a rezarei como está no Missal!” Parece que os senhores bispos tem um enorme problema em transferir párocos que estão há muitos anos numa comunidade, mesmo que estes estejam fazendo um mal monumental às almas e afastando os fiéis da Igreja. Os bispos conseguem ter pena de UM, mas são incapazes de ver que MUITOS estão a sofrer por causa daquele um.

Fui transferido para outra paróquia, para ser coadjutor de um sacerdote mais jovem. Fui bem recebido pelo pároco. Cheguei no dia exato em que estava acontecendo o tradicional mutirão de confissões preparatórias para a Páscoa. Atendemos até 1 hora da manhã mais ou menos. Após o jantar os padres foram embora e, quando só restamos nós dois, então conversamos. Ele me perguntou se eu tinha gostado da comunidade, e, então, me disse: “Bem, seja bem-vindo aqui então. Vou logo te avisando, eu quero um coadjutor aqui pra trabalhar. O que você vai fazer com seu tempo pessoal é problema seu desde que você cumpra suas obrigações. Você não vai morar comigo aqui na casa paroquial. Temos uma capela que tem sua casa própria. Vou te dar as chaves e você vai morar lá. Assim, se você quiser, pode ter suas visitas íntimas; Só toma cuidado para não arrumar um filho.” Chorei o resto da madrugada inteira. Chorei, D. Orani, por que me lembrei das palavras de Nosso Senhor ao Santo Padre Pio falando sobre os sacerdotes: “Vede como me tratam como açougueiros?”. Uma vez, num sábado, eu estava sentado ao confessionário e deveria ter umas dez pessoas na fila. O Pároco chegou de repente e pediu que as pessoas voltassem outro dia, porque ele precisava muito de mim. Os fiéis foram embora e eu o ajudei a fechar a igreja. Perguntei então aonde íamos e que tipo de ajuda ele precisava de mim. Quando ouvi a resposta fiquei estarrecido, não acreditava no que eu estava ouvindo: “preciso que você vá à concessionária comigo para me ajudar a escolher meu carro novo”. Pena que muitos padres não acreditem mais no castigo dos Céus, porque ele veio: exatamente uma semana depois ele capotou com o carro novo na Avenida Brasil. Graças a Deus não se feriu gravemente, mas o carro deu perda total!

Em 2007 pedi a Dom Eusébio que me permitisse fazer uma experiência no recém-criado IBP (Instituto Bom Pastor). Fui então para S. Paulo e morei lá um pouco tempo. A convivência lá era muito boa, contudo, o que garantia a permanência do IBP em São Paulo, era o apoio econômico do Professor Orlando Fedeli e da sua Associação Cultural Montfort. Chegou um período que os padres e os seminaristas que lá estávamos, julgamos que a Montfort influenciava muito dentro do seminário e que se fazia necessária uma clara distinção entre as duas instituições: Montfort e IBP. Aliás, nós padres, muitas vezes sentíamos que só servíamos para ministrar sacramentos e mais nada. Até nossos sermões foram muitas vezes submetidos a julgamentos. Outro fato que me levou a desacreditar no IBP foi que o superior geral, o Padre Phillipe Laguérie, que deveria tomar uma medida firme para diminuir a influência da Montfort dentro da casa do IBP, não o fez, sobretudo depois de uma visita do Prof. Fedeli a Bordeaux (França) e uma conversa com Pe. Laguérie. Bem, um superior geral que não toma medidas firmes e se deixa vencer pelo respeito humano não é digno da minha confiança. Por esses e outros motivos, retornei ao Rio de Janeiro.

Vim para a Paróquia Bom Pastor, inicialmente como coadjutor do meu irmão e, depois, como Pároco. Mas estou numa terrível crise de consciência desde então. D. Orani. Juro ao senhor que eu tentei de TUDO para me enturmar com o clero daqui. Pensei comigo mesmo “E se eu estiver sendo rígido demais? E se eu tentasse ser mais maleável para tentar me enturmar melhor?” Fiz muitas tentativas para me entrosar com o restante do clero. Tirei minha batina e o senhor sabe muito bem disso. O senhor mesmo já me viu sem batina algumas vezes… Cedi muitas vezes, me calei muitas vezes quando eu não concordava com algo; como dizia São Paulo: “fiz-me tudo para todos na esperança de salvar alguns” (1Cor 9,22). Mas descobri uma coisa: cheguei à conclusão de que com o MODERNISMO não existe diálogo! É inútil! É o mesmo que “pôr um remendo novo em roupa velha” (cf. Mt 9,16). Eu abri mão do que é justo, bom e honroso, mas não há reciprocidade… ninguém ficou mais tradicional nem obedeceu mais à disciplina da Igreja por causa disso. No final, eu é que estava virando um progressista! Ouvi este sábio pensamento uma vez: Dez laranjas boas não CURAM uma que está podre, mas é precisamente a ÚNICA PODRE que vai contaminar TODAS as outras dez. Coisas ruins sempre se aprende com mais rapidez e facilidade que as coisas boas. Destruir é bem mais rápido que (re)construir. É por esse motivo que eu não posso mais ficar aqui, D. Orani. Não pense que faço isso sem dor na consciência. Mas chegou a hora (e já até passou) de eu deixar de lado o respeito humano e dizer o que eu realmente penso e ficar em paz com minha consciência.

Primeiramente, como católico, eu não estou obrigado a aceitar o Concílio Vaticano II, uma vez que este foi um concílio pastoral e não um concílio dogmático.

- Quanto à Missa, não nego a validade da nova missa, contudo afirmo que ela é ambígua e não expressa, como a de S. Pio V, os principais dogmas católicos. Confesso que celebro com muita relutância a missa segundo o Novus Ordo (de Paulo VI). Não posso aceitar o ofertório do Novus Ordo que é uma berakah judaica. É claramente uma ceia e não um sacrifício! Há muito tempo que eu o substituo pelo Ofertório Tradicional. Faço esta e outras modificações para que a missa nova seja o mais suportável possível para mim e possa expressar o mais possível os nossos dogmas de fé. Contudo isso me incomoda muitíssimo, pois sei que não tenho a graça de estado para modificar um rito. Mas em consciência, não posso continuar a celebrar esse rito!

- Também quanto aos Sacramentos (Batismo, Confissão, Matrimônio e Extrema Unção) e o Breviário eu faço no rito antigo já faz algum tempo.

- Não compreendo e não aceito a concelebração eucarística! Enfim, D. Orani, minha presença aqui mais atrapalha do que ajuda esta Arquidiocese. E atrapalha também a mim e ao meu crescimento espiritual, pois é muito cansativo viver num eterno conflito. Cada reunião do clero é uma nova batalha. Tenho evitado ir às cerimônias e encontros da Arquidiocese, pois assim eu peco menos. Fui ao aniversário de 90 anos de Dom Eugênio exclusivamente para pecar: “você meu amigo de fé, meu irmão camarada” cantado para um Cardeal, durante a Santa Missa numa Catedral? Elba Ramalho cantando “Asa Branca” no presbitério? Desculpe, Dom Orani, é demais para mim. Perdoe meu desabafo. Desculpe o transtorno. Não me queira mal. Sinto-me uma ave solitária aqui… pelo menos se eu for, poderei ajuntar-me ao bando dos de minha espécie.

Estou me unindo à Fraternidade Sacerdotal São Pio X (FSSPX). Devo passar algum tempo no seminário na Argentina para refazer algumas matérias da Teologia (principalmente da teologia moral que é muito fraca no seminário do Rio) e, depois seguir, como missionário, onde os senhores bispos da Fraternidade me enviarem.

Não me tome por cismático e nem herege. Afinal, como Mons. Lefèbvre dizia: “não fundamos uma religião nova, não criamos novos sacramentos, não criamos uma nova missa, não inventamos liturgia própria, apenas queremos conservar, seguir e ensinar aquilo que a Igreja SEMPRE ensinou”.

Mais uma vez peço perdão pelo transtorno e humildemente peço vossa bênção e vossas orações.

In Iesu et Maria,

Rio de Janeiro, 25 de Janeiro de 2011

Festa da Conversão de São Paulo



Pe. Leonardo Holtz Peixoto


Padre Leonardo Holtz em entrevista exclusiva ao Fratres in Unum.

Extraído de Frates in Unum.com

Primeiramente, padre Leonardo, muito obrigado por ter aceitado o nosso convite. Por favor, apresente-se aos nossos leitores.

Padre Leonardo HoltzBem, eu me chamo Padre Leonardo Holtz Peixoto. Nasci no Rio de Janeiro, na Rua do Bispo, aos 11 dias do mês de fevereiro de 1980. Fui criado no subúrbio do Rio, no bairro de Inhaúma e freqüentei a Paróquia de São Tiago. Lá recebi os sacramentos da iniciação cristã e também comecei a descobrir a minha vocação.

Conte-nos como o senhor discerniu a sua vocação e como foi a sua entrada no seminário.

Eu devia ter uns 13 anos de idade e fui com minha família participar de um retiro de carnaval da RCC – Renovação Carismática Católica – pregado pelo Mons. Jonas Abib no Maracanãzinho. Contudo, o início do meu chamado vocacional NADA teve a ver nem com a RCC nem com a pregação do Mons. Jonas Abib, mas com uma solene bênção do Santíssimo Sacramento que houve por lá. Lembro-me que eu estava nas arquibancadas do ginásio, quando o Santíssimo Sacramento passou em procissão, sob o pálio, acompanhado de carrilhões, velas, muito incenso e um magnífico cortejo. Quando dei por mim, estava já chorando e de joelhos. Digo sempre que minha vocação começou pela EUCARISTIA.

Como era o ambiente do seu seminário diocesano?

O ambiente do seminário era bem diversificado, como já se podia esperar de um lugar com tantos candidatos de lugares e formação diferentes. Havia seminaristas mais e menos piedosos. A disciplina do seminário não era de todo má. Contudo, o comportamento de alguns era inaceitável para um cristão, especialmente se esse cristão almejava algo tão sublime como o sacerdócio. Algumas vezes surgiam algumas conversas e atitudes impróprias por parte dos seminaristas, mas nenhuma medida mais enérgica era tomada. Por diversas vezes eu era tido como “anti-social” por ficar recluso na minha cela e não querer participar de tais momentos.

A semana de oração pela unidade dos cristãos era algo que me revoltava dentro do seminário. Não entendia como se podia chamar os hereges protestantes para pregar dentro de um seminário católico.

E o interesse pela Tradição da Igreja, como surgiu?

Surgiu na biblioteca do seminário. Descobri uma sessão de livros antigos na biblioteca que me causaram interesse. Um em particular: um livro vermelho e grande, com o título “Missale Romanum” na lombada. Havia também breviários e rituais romanos. Infelizmente, quando alguém percebeu esse interesse pelos livros antigos, fui proibido de retirá-los da biblioteca. Mas eu ainda poderia consultá-los na própria biblioteca. Foi aí que um dia, quando cheguei à biblioteca, toda a estante havia desaparecido sob o “pretexto” de um vazamento que, curiosamente, apareceu exatamente sobre a estante dos livros tradicionais.

Havia outros dois colegas de seminário que se interessavam pela tradição. Nós três rezávamos, às vezes, escondidos, o ofício de completas no rito de S. Pio V à noite. Um desses colegas era o Padre Fábio Calixto da FSSPX. O outro, pouco tempo depois, escandalizado, saiu do seminário.

Quando o senhor assistiu pela primeira vez a Santa Missa Tradicional? Conte-nos também quando foi a primeira vez que o senhor a celebrou.

A primeiríssima Missa de Sempre que assisti, foi na igreja do Outeiro da Glória, no aniversário de Sua Alteza imperial e Real, o príncipe Dom Luis de Orleans e Bragança, celebrada pelo Reverendo e finado Padre Hélio Buck Júnior. A primeira Missa Tradicional que celebrei foi 4 dias depois de minha Ordenação Sacerdotal, na casa dos irmãos da Toca de Assis em Madureira. Eu já vinha treinando como diácono sozinho em casa.

O senhor teve contato com outros institutos tradicionais, tendo ainda como seminarista procurado a recém erigida Administração Apostólica. Como foi esta experiência?

Sim, tive contato com a Administração Apostólica e também com o IBP (Institut du Bon Pasteur). Quando diácono, em 2002, estive presente à Sagração de Dom Rifan. Logo após, fui visitá-lo e pedi ingresso na Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney. Dom Rifan na ocasião me disse que era melhor eu continuar na Arquidiocese do Rio, pois eu podia fazer um bom apostolado por lá e ser uma influência tradicional em meio ao clero carioca. Francamente, não entendi como ele podia ter rejeitado um futuro padre tradicional, já que havia tão poucos, e que era tão difícil conservar a tradição em meio ao modernismo.

Quanto ao IBP, foi no ano de 2007 que eu implantei a Missa de Sempre na paróquia onde eu era pároco – São Judas Tadeu – no bairro de Senador Vasconcellos. É claro que é uma ilusão achar que a Missa de Sempre pode conviver pacificamente com a missa nova; chega uma hora que os abusos da missa nova se contrastam com o esplendor da Missa de Sempre. Foi nesse momento que, sob muita pressão, resolvi pedir ao Cardeal Dom Eusébio para deixar a paróquia e ir para o IBP. O Cardeal concedeu e, então, viajei para São Paulo.

Outra decepção…?

Sim, outra decepção! E não podia ser diferente do jeito como o IBP nasceu. O IBP é fruto do êxodo de alguns padres da FSSPX. Às vezes, de dentro, eu percebia no IBP uma preocupação maior em criticar a FSSPX do que promover a Missa de Sempre. Outra relação delicada em São Paulo era a relação Montfort-IBP. Em parte deixei São Paulo por não concordar com a demasiada influência da Montfort na casa onde o IBP residia. Também notava que a função do sacerdote ali era ser “máquina” de sacramentos.

Como era a sua vida de padre diocesano, tendo já conhecido os tesouros da Igreja mas ainda obrigado a celebrar o Novus Ordo Missae?

Esse era um verdadeiro dilema! Por um lado havia a consciência de que eu era um pároco de uma diocese progressista, numa paróquia progressista e com pensamentos que iam contra tudo o que se pensava na diocese. Era uma verdadeira “ginástica” para ensinar a tradição, num meio modernista sem ser demasiado modernista. Algumas vezes eu tive que fazer concessões (como, por exemplo, o Cerco de Jericó), afinal, se quisermos fazer a tradição ser amada e conhecida, não a podemos impor, mas sim anunciá-la paulatinamente.

O senhor chegou a expressar suas convicções e perplexidades aos seus superiores, pedindo esclarecimentos e atitudes? E como elas foram recebidas?

Sim. Escrevi cartas tanto a Dom Eusébio como a Dom Orani, e também tivemos colóquios pessoais. Dom Eusébio não recebeu muito bem, mas já Dom Orani, foi muito paternal e acolheu muitíssimo bem. Na verdade, nada me faz mudar de idéia de que Dom Orani SEMPRE esteve muito bem intencionado, contudo, cercado das pessoas erradas.

E o que especificamente o levou a optar pela Fraternidade de São Pio X?

Primeiramente pela minha veneração desde os tempos de seminarista à pessoa de Mons. Marcel Lefébvre. Inclusive, alguns colegas de turma me apelidaram de “Lefébvre” no seminário. Mas, o real motivo foi que ao analisar as posturas da Administração Apostólica, do IBP, do Instituto Cristo Rei e da FSSP (Fraternidade Sacerdotal São Pedro), percebi que não há como manter a tradição da Igreja hoje, a não ser na FSSPX. A grande realidade é que não há como dialogar com o modernismo. Todos os que tentaram ficar na dita “legalidade” foram amordaçados e não preservaram a fé e a doutrina. Afinal, não celebramos a Missa de Sempre apenas por uma questão estética ou como uma das muitas opções válidas, mas porque cremos firmemente que a Missa Tradicional é uma autêntica profissão da fé católica.

Quem mais o auxiliou nesse itinerário de pedido de ingresso na Fraternidade?

Capela de São Sebastião em Arraial Novo.Primeiramente, aquele meu amigo de seminário que foi para a FSSPX, o Padre Calixto, sempre que vinha de férias na casa da família, no Rio, ia me visitar. Certa vez ele me convidou a ir conhecer a capela de Dom Lourenço, em Niterói e eu fui. Mas efetivamente, todo esse movimento em direção à FSSPX começou incrivelmente pelo meu finado Orkut. Ali eu postava minhas fotos e meus pensamentos tradicionais. E não hesitava em dizer o que era preciso e não o que as pessoas gostam de ouvir. Atraía diariamente muitos ‘scraps’, alguns de crítica e outros de incentivo. Um jovem de Rondônia certa vez me deixou o seguinte recado: “Padre, acho que encontrei uns primos seus e são todos da Tradição. Vou verificar e falo para o senhor depois”. Ele verificou e era verdade. Eu fiquei encantado! São os fiéis de Arraial Novo, em Bom Jesus do Itabapoana, estado do Rio. Essa comunidade é atendida pelos padres da FSSPX de São Paulo e pelos Monges do Mosteiro da Santa Cruz, em Nova Friburgo.

Quando Dom Tomás de Aquino, prior do mosteiro, ficou sabendo de um padre que desejava ser tradicional no Rio de Janeiro, apareceu na minha casa no Rio para uma visita. E assim, continuamos em contato. Uma semana antes da visita de Dom Tomás, recebi com alegria o telefonema do Padre Rodolfo Eccard, da FSSPX, que desejava ir conversar comigo. Ele foi até minha paróquia, onde conversamos e, depois, almoçamos juntos.

Depois disso estive uma vez em Niterói, onde conversei e almocei com o padre Rodolfo e com Dom Lourenço. Na semana seguinte, recebi em casa a visita do padre Daniel Maret, que estava impressionado com minha história e me convidou para a FSSPX. Em julho do ano passado, passei uma semana no Mosteiro da Santa Cruz, onde fiz um retiro espiritual.

O senhor esteve em La Reja. Conte-nos mais sobre o ambiente que o senhor encontrou por lá.

Bem, encontrei o seminário que eu imaginara nos meus sonhos – uma capela digníssima e jardins celestiais. Um ambiente alegre e descontraído e, ao mesmo tempo, sério e piedoso. Infelizmente, muita gente pensa que para ser “tradicionalista” a gente tem que ficar de cara séria e andar duro feito um robô. Queremos conservar a tradição, não ser Arautos do Evangelho!

Os padres possuem uma serenidade – a serenidade de quem tem a consciência tranqüila diante de Nosso Senhor, por estar transmitindo a VERDADE que Ele nos ensinou. Os bispos, Dom Tissier e Dom Galarreta são uma simpatia. A simplicidade e a firmeza de Dom Tissier encanta; a elegância, a nobreza e a humildade de Dom Galarreta é o que todos esperam ver num prelado da Igreja. É ele quem serve os padres à mesa de refeição!

Qual foi a reação dos seus paroquianos e irmãos sacerdotes quando o senhor anunciou que deixaria a paróquia e até mesmo a diocese para procurar a FSSPX?

Os paroquianos ficaram tristes. Pelo menos foi o que a maioria me disse (risos). O que me foi dito de forma quase unânime foi: “sentiremos falta dos seus sermões e dos seus ensinamentos (catecismo)”. Quanto aos padres, nem se aperceberam, pois como eu tratei direto com Dom Orani, creio que eles tenham sabido por agora.

Após o anúncio, o senhor teve um longo encontro com Dom Orani, que lhe fez uma proposta “tentadora”. Em que ela consistia?

Consistia em permanecer no Rio de Janeiro e conservar a liturgia e a doutrina tradicionais. Eu estaria desobrigado a celebrar a missa nova ou concelebrá-la; mesmo nas cerimônias da Catedral ou dos retiros do clero. Estaria desobrigado de ministrar qualquer sacramento conforme os novos rituais; poderia rezar o Breviarium Romanum no lugar da Liturgia Horarum; teria uma capelania EXCLUSIVA para executar o meu apostolado tradicional no Rio de Janeiro e não estaria obrigado a aceitar a Campanha da Fraternidade ou qualquer outra iniciativa comunista, marxista etc.

Todavia, tudo não passou de palavras e o senhor não conseguiu colocar em prática aquilo que lhe fora assegurado. Conte-nos como isso ocorreu.

Como já disse aqui anteriormente, não creio que Dom Orani agiu de má fé. Ele é um homem bom, de princípios. Ele teve realmente intenção de ajudar. Inúmeras vezes me enviava mensagens de SMS para o celular, preocupado com a minha situação, o que era coisa inédita para mim. Sempre os bispos se colocavam em “pedestais” e eram quase intocáveis. De repente, aparece um bispo que tem o meu celular e eu o dele e que nos comunicamos facilmente por SMS! Infelizmente, não sei que conversas surgiram “ao pé do ouvido”. A impressão que eu tive é que tinham medo de que se eu, com meu pensamento tradicional, ficasse sozinho numa igreja própria, pudesse “abrir os olhos” de muitos fiéis para a verdade e isso causaria um grande “barulho” não só na diocese do Rio, mas no Brasil. Então, para me “moderar”, fui enviado a uma igreja onde já havia uma missa nova e uma celebração da palavra com um diácono permanente diariamente. Sobre o convívio do Novus Ordo com a Missa de S. Pio V, já manifestei minha opinião acima.

A igreja só funcionava de segunda à sexta-feira e fechava às 15h todo dia. O horário que me foi dado para celebrar era às 10 da manhã, impossível para quem trabalha ou estuda. Esse arranjo pareceu-me uma coisa matematicamente feita para desestimular paulatinamente.

Alguns acusaram-lhe de “abandonar a primeira paróquia pessoal do Brasil” — embora ela nunca tenha existido, sendo apenas um projeto — e de tomar decisões abruptas, como sua partida do Instituto do Bom Pastor, em São Paulo… Como o senhor responde a essas afirmações?

Foi bom você mencionar isso. Tal acusação infundada foi feita no sítio da Associação Cultural Montfort. Pessoalmente enviei uma réplica ao seu novo presidente, o Sr. Alberto Zucchi, mas, infelizmente, não foi, até o presente momento, postado meu comentário.

Primeiramente, a paróquia pessoal, como você bem disse, NUNCA existiu. E, na verdade, não havia um projeto de paróquia pessoal. Pelo menos, não num primeiro momento, mas de uma capelania ou reitoria exclusiva. Essa “paróquia pessoal”, no meu entender viria com o tempo de acordo com o crescimento da comunidade tradicional carioca.

Em segundo lugar, por “abrupto” eu entendo “de repente”, e isso é uma inverdade! Em nenhuma das duas ocasiões, como já mencionei aqui, deixei a arquidiocese abruptamente: na primeira, tive o pleno aval do Sr. Cardeal e desta última, já expus acima que escrevi uma longa carta e, posteriormente, tive uma longa conversa com Dom Orani. O que há de “abrupto” nisso? Quanto à minha saída dita “repentina” de São Paulo, para regressar ao Rio, isso também é, não só uma inverdade como uma injustiça, visto que eu conversei sobre esse assunto com o Prof. Orlando Fedeli. Eu não tinha condições psicológicas de continuar naquele lugar. Não concordava com suas posições, dependia deles materialmente e não tinha com quem desabafar. Fiquei numa angústia tão grande que tive uma paralisia no braço e na mão direita, por causa do sistema nervoso. Foi graças à generosidade do Sr. Stacciarini, que me levou ao hospital e pagou os meus medicamentos, que fui melhorando.

Muitos católicos esperam por tempos melhores, em que padres diocesanos efetivamente amem a Tradição e façam de suas paróquias núcleos fervorosos da verdadeira Fé. Alguns fiéis tradicionais do Rio lamentam o fato do senhor não ter oferecido a Missa Tradicional em sua paróquia ao menos aos domingos e dias de guarda, ainda que uma decisão posterior viesse a ser tomada em favor da opção exclusiva pelo rito antigo. Na qualidade de pároco, quais os maiores obstáculos que o impediram de transformar sua paróquia em uma referência nesse sentido?

Já mencionei aqui a minha experiência na Paróquia de São Judas Tadeu, na Zona Oeste do Rio, onde, como pároco, implantei a Missa Tradicional todos os Domingos. Foi justamente o choque que entre os dois ritos que me fez deixar a paróquia. Não quis repetir o mesmo fato na Paróquia Bom Pastor. Alguns poderão dizer que foi por respeito humano ou qualquer coisa similar, mas “quem estiver sem pecado, atire a primeira pedra” (Jo 8,7)

Muitos padres diocesanos hoje em dia reclamam da clericalização dos leigos e dizem até que eles mandam na paróquia. O padre seria apenas um dispensador de sacramentos enquanto os movimentos e pastorais seriam administrados por seus próprios coordenadores. O senhor sentiu isso na pele?

Sim e não! Tudo depende de como o padre se posiciona frente aos seus fiéis. Se o padre adotar a postura de um leigo e não fizer o que precisa ser feito, aí sim os leigos dominam. Sempre deixei claro isso em minhas duas paróquias. Várias vezes eu disse nas reuniões de conselho paroquial: “A Igreja não é, não foi e, no que depender de mim, jamais será democrática. Ela é hierárquica!”

Chegando agora à Fraternidade, como o senhor encara as discussões teológicas em andamento? É possível ter esperanças de um bom termo?

Com relação a isso, meu pensamento é o mesmo com relação ao Ecumenismo: só entendo o ecumenismo se for com a intenção de converter os hereges e chamá-los à verdadeira fé, assim, só aceito o “diálogo”, se for para abrir os olhos do progressismo e chamá-los à verdadeira doutrina. Caso contrário, tal diálogo não passa de um “chá das cinco”.

Enfim, Padre, antes de ser formalmente aceito como membro da FSSPX, o senhor passará por algum período de experiência? Quais são os planos para o futuro?

Bem, francamente, ainda não pensei muito sobre isso (risos). Estou num momento tão bom que nem pensei nisso. Todos estão dizendo que fiquei notoriamente mais “feliz”. De fato, parece que um pesado fardo me foi retirado das costas. Com relação ao futuro, prefiro não planejar, mas deixar nas mãos de Nosso Senhor. Afinal, foi Ele que me conduziu até aqui; Ele sabe o que faz.

Que mensagem final o senhor daria aos leitores do Fratres in Unum?

Aprendi na Teologia que há uma ignorância vencível e uma ignorância invencível. Aos leitores do Fratres eu diria, que quando permanecemos na ignorância vencível, isto é, quando temos condições de ver a luz e segui-la, mas por comodismo ou qualquer outro motivo não a seguimos, somos culpáveis em juízo. Portanto, busquem a verdade e, encontrando-a, amem-na. “Buscai o Senhor, enquanto ele se deixa encontrar” (Is 55,6) Deus abençoe!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Infelizmente, devido ao alto grau de estupidez, hostilidade e de ignorância de tantos "comentaristas" (e nossa falta de tempo para refutar tantas imbecilidades), os comentários estão temporariamente suspensos.

Contribuições positivas com boas informações via formulário serão benvindas!

Regras para postagem de comentários:
-
1) Comentários com conteúdo e linguagem ofensivos não serão postados.
-
2) Polêmicas desnecessárias, soberba desmedida e extremos de ignorância serão solenemente ignorados.
-
3) Ataque a mensagem, não o mensageiro - utilize argumentos lógicos (observe o item 1 acima).
-
4) Aguarde a moderação quando houver (pode demorar dias ou semanas). Não espere uma resposta imediata.
-
5) Seu comentário pode ser apagado discricionariamente a qualquer momento.
-
6) Lembre-se da Caridade ao postar comentários.
-
7) Grato por sua visita!

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.

Pesquisar: