sexta-feira, 14 de setembro de 2012

A paz da alma.

A PAZ DA ALMA

(Primeira parte: liberdade, felicidade e oblação)

d. CURZIO NITOGLIA

{Tradução: Gederson Falcometa]

30 de março de 2012

http://www.doncurzionitoglia.com/pace_anima.htm



Início uma série de artigos sobre paz interior.

Neste primeiro artigo trato da verdadeira liberdade dos filhos de Deus, diametralmente oposta a licença do liberalismo e dos mundanos. Como abordarei todos os aspectos que dizem respeito a beatitude sobrenatural, imperfeita nesta vida e cumprida apenas na eternidade.

D. Curzio Nitoglia

PRIMEIRA PARTE

*

Liberdade, felicidade e oblação.



Se vivemos na graça de Deus, a SS. Trindade habita fisicamente e realmente na nossa alma. Os Santos nos convidam a entrar na parte mais profunda dela (o “espírito”, que é a alma elevada à ordem sobrenatural) e a permanecemos na presença amorosa de Deus. Também nas circunstâncias externas mais difíceis e desfavoráveis, temos dentro de nós um espaço de paz interior que ninguém pode perturbar, porque esta presente Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo. Esta é uma verdade de Fé que todo cristão deveria conhecer, e que, uma vez conhecida e crida, deve ser vivida e cultivada. Deus esta presente em nós para conhecer-nos, amar-nos e conviver conosco, e nós devemos conhecê-lo, amá-lo e viver junto a Ele. Esta é a natureza da vida espiritual ou sobrenatural: Fé, Esperança e Caridade vividas na meditação ou colóquios com Deus. Enquanto não vivermos sobrenaturalmente, estaremos angustiados, aleijados e privados de verdadeira paz e liberdade da alma, que apenas Deus conhecido, amado e vivido pode nos dar. São Paulo nos revela: “Onde está o Espírito do Senhor, ai existe a liberdade” (2 Cor., III, 17). Se quisermos viver, apesar das provas e das cruzes da vida terrena, em paz com Deus, com nós mesmos e possivelmente com o próximo, devemos aprofundar na meditação desta verdade e buscar vive-la quotidianamente. Somente então, nada nos sufocará interiormente, ainda que exteriormente as vicissitudes possam ser extremamente adversas e dolorosas.

O homem conquista a verdadeira liberdade interior e a paz da alma na medida em que fortifica a sua Fé e a vive na Esperança e na Caridade, mediante a oração e os Sacramentos.



Conditio sine qua non para fortificar as Virtudes teologais é a verdadeira humildade de coração, que consiste em esvaziar-se do nosso amor próprio ou do nosso “eu” para dar espaço a Deus que nos ama e quer ser amado. A verdadeira liberdade é a liberdade do erro e do pecado, que apenas o Bem e o Verdadeiro nos dão. O liberalismo é o pervertimento egocêntrico desta máxima e faz da liberdade não um meio, mas um fim e absoluto, uma espécie de ídolo ou falsa divindade, que nos tornaria patrões e capazes de fazer aquilo que queremos, incluindo o mal e o erro. Jesus, ao invés nos revelou: “a Verdade vos fará livres” (Jo, VII, 32), enquanto “quem faz pecado, é escravo do pecado”. Deus quer que nós reconheçamos não sermos nada e que Ele é tudo. “Eu sou Aquele que é, tu aquela que não é” disse Jesus a S. Catarina de Siena. Portanto não devemos nos preocupar com aquilo que não podemos fazer com as nossas forças. Deus é onipotente e muitas vezes que para nós aquilo que nós não queremos, mas Ele pode aquilo que nós não podemos fazer. Então, se nos chama a uma tarefa tenhamos confiança na sua Providência onipotente e misericordiosa, a qual nos ajudará a fazer aquilo que sozinhos não conseguiríamos jamais cumprir.



O homem foi criado para a Felicidade ou Beatitudine, que poderá conseguir perfeitamente apenas no Paraíso, depois de ter atravessado muitas provas ou “cruzes” (“cruz” vem do latim “cruciari” que é ser atormentado). Apenas a via do calvário e do tormento leva a Ressurreição. Sobre isto não devemos nos iludir. Mas nem sequer ver jansenisticamente a vida como feita apenas de penes e de dores. Não. Nesta vida terrena existem alegrias e dores, e a dor deve ser vivida positivamente, como meio de refinamento espiritual que nos aproxima de Deus. Não deve ser absolutizada, nem recusada, é uma realidade com a qual devemos fazer as contas todos os dias, mas que podemos superar e transmutar em “ouro” com a ajuda da graça do Senhor.



A alma é aberta ao infinito, embora sendo finita em si mesma. O homem tem o desejo de conhecer e amar alguma coisa de espiritual e infinita que é Deus. Pelo qual não pode e nem deve conduzir uma vida raquitica e atrofiada. S. Agostinho depois de ter buscado a felicidade nos bens materiais, nos prazeres sensíveis e na filosofia maniqueista, escreveu nas Confissões: “Tu nos fez para Ti, ó Senhor, e o nosso espírito é infeliz até que não encontre paz em Ti”. Apenas qualquer coisa de infinito, o Summum Bonum et Verum, que é Deus, pode dar a verdadeira paz – relativa sobre esta terra e absoluta apenas na outra vida – ao homem, que tem uma alma espiritual aberta ao infinito e que não pode ser satisfeita pelas coisas finitas e limitadas. O conhecimento e o amor do Verdadeiro e do Bem nos dão a felicidade e a liberdade, o erro e o mal nos tornam infelizes e escravos (S. Catarina de Siena, Diálogo, cap. 51). O homem sente a necessidade de ser conhecido, benquisto, amado pelo próximo e sobretudo por Deus, o qual é o único que pode fazê-lo perfeitamente e segundo as nossas reais necessidades, que os homes podem não conhecer e que certas vezes, até fogem de nós mesmos.



A verdadeira liberdade interior não é uma “conquista social e política do homem moderno”, que se emancipou de toda autoridade humana e divina (“nem Deus, nem patrão”), para o cristianismo e a sã filosofia a liberdade é uma faculdade que nos ajuda a escolher os melhores meios para fazer o bem e fugir do mal. Essa consiste exatamente no contrário da “liberdade” ou melhor “licença” moderna: livre é quem se uniformiza e conforma a realidade verdadeira e boa e a Deus autor da realidade criada. Devemos pedir a Deus para reforçar em nós, feridos pelo pecado original, esta capacidade, que é um meio e não um fim, de forma que possamos ser verdadeiramente livres e não abusar ou usar mal da liberdade fazendo o mal e aderindo ao erro, os quais são sinais defeituosos de liberdade, mas não são a essência da liberdade, como por exemplo, a doença é sinal de deficiência de vida: tem a virtude da força e o dom e fortaleza do Espírito Santo que aperfeiçoam em nós o querer e o operar de modo que são segundo a natureza, que tem como fim o verdadeiro e o bem e não contra a natureza e des/ordenada ao erro e ao mal. Apenas o santo, que é o verdadeiro cristão, é verdadeiramente livre, porque – como ensina S. Paulo – perdeu o próprio “eu” para fazer viver nele Jesus Cristo (“vivo jam non ego, sed Christus vivit in me”). Depois do pecado original a nossa personalidade é vulnerável, um pouco “original” e apenas perdendo a nossa para adquirir aquela de Jesus Cristo poderemos ter uma sã e plena personalidade, livre e dona de si e dos acontecimentos, e não escrava do amor próprio, do egoísmo, daquilo que acontece em torno de nós: “Quem quer preservar a sua vida a perderá, mas quem a perder por amor a mim a salvará” (Mt., XVI, 25). Só o que esta dentro de nós, pode nos fazer o bem ou o mal, enobrecer ou nos diminuir. Aquilo que acontece em torno de nós, não deve nos preocupar. Esta é a verdadeira liberdade, que poderemos alcançar apenas com a ajuda da graça de Deus: “Sine Me nihil potestis facere” nos revelou Jesus.



Muitas vezes nos enganamos e pensamos que a verdadeira liberdade e felicidade são alguma coisa exterior, dependente das circunstâncias que estão ao nosso redor. Também Santo Agostinho antes de converter-se tinha cometido este erro: “Quaerebam Te foras sed intus eras; Te buscava fora de mim, mas tu estavas dentro e eu fora de mim” (Confissões, liv. X). Que não são as circunstâncias da vida a limitar a nossa liberdade e a paz da nossa alma. Certamente essas ainda exercitam um certo influxo sobre nosso ânimo, mas não o determinam. É dever nosso, superar certos obstáculos externos que nos impediriam de fazer o bem e evitar o mal. Todavia o essencial não consiste nas circunstâncias externas a nós, mas na nossa vontade. Não devemos (e não podemos) mudar a realidade, porém podemos e devemos mudar nós mesmos em relação a Deus e ao próximo.



Santo Tomás de Aquino ensina que “um homem é dito bom, não porque tem boa inteligência, mas porque tem uma boa vontade”. Então, é sobre a nossa vontate que devemos trabalhar para melhorá-la e torná-la verdadeiramente livre e em paz consigo mesma. A vontade humana será livre se submissa a vontade de Deus e capaz de comandar as paixões da sensibilidade de forma que o corpo obedeça a alma e essa a Deus. A monotonia da vida quotidiana e mesmo os sacrificios que nos faz enfrentar podem ser transformadas e sublimadas pelo homem interior que vive unido a Deus, o qual de Deus obtém tudo (“eu posso tudo Naquele que me fortalece”, S. Paulo). O amor que nos faz sair de nós mesmos e nos une a Deus, nos dilata e nos torna “participantes” de maneira limitada e finita da Natureza do próprio Deus (2 Epístola de São Pedro). Se nos sentimos em dificuldade, angustiados ou “no aperto”, quase aprisionados e privados de liberdade e paz, o problema não se encontra especialmente no lugar onde vivemos, mas sobretudo em nós, na nossa alma e na falta de verdadeiro amor sobrenatural por Deus e pelo próximo, que nos torna frios, egoistas, curvados sobre nós e estéreis. A liberdade e a paz se encontram em nós mesmos, na nossa alma espiritual e livre, não nas coisas que nos circundam. Certamente algumas circunstâncias podem ser dificeís, mas somos nós a piorar a situação pela nossa falta de Fé e de Amor.



Se olhássemos todas as coisas a luz da Fé e amássemos sobrenaturalmente, também as cruzes mais pesadas, tudo se transformaria em meio e em graça; este é o segredo. O cristão, mediante a graça de Deus, tem a capacidade real de crer, esperar e amar em cada circunstância e isto o torna capaz de tirar um bem espiritual de cada mal que possa tocá-lo ou ferí-lo. Ainda em cárcere, ainda sobre o patíbulo nos resta a capacidade de crer, esperar e amar e então de sermos livres e em paz com Deus; certamente é uma paz interior, da parte superior da alma (intelecto e vontade), que não excluí o sofrimento da sensibilidade. Jesus no Getsemani quer provar “medo, cansaço e tristeza” na parte sensível da sua humanidade, mas ao mesmo tempo a sua alma gozava da visão Beatifica. Não devemos jamais confundir o sentir com o querer. Se a sensibilidade sofre em certas circunstâncias, a alma com a ajuda da graça divina pode sempre continuar a crer, esperar e amar em liberdade e paz de espírito.



A liberdade interior não consiste tanto no escolher aquilo que queremos, mas no dizer “sim” também àquilo que não nos dá prazer e que encontramos à frente. Nossa Senhora disse “fiat” ao Anjo que lhe anunciava a sua Materinidade divina e o seu Calvário aos pés de Jesus crucificado. Esta é a verdadeira liberdade interior que também nos faz superar com amor as provas mais árduas, porque nessas vemos a mão de Deus e a amamos. A liberdade consiste mais no dar-se que no possuir ou dominar. É preciso saber como aceitar a realidade, tal qual ela é, e não como nós gostaríamos que ela fosse, com esperança e amor, dia após dia, para fazer-lhe um sacríficio a Deus.



O problema, a dificuldade começa propriamente quando bate a nossa porta aquilo que não nos dá prazer, que nos contrária e nos faz sofrer. Mas é precisamente nestas situações que devemos usar da vontade livremente para conseguir a paz interior, aceitando aquilo que nós não tinhamos projetado e mesmo que nunca iríamos querer. O segredo para obter a plena liberdade interior consiste no recusar os nossos caprichos, os nossos gostos, porque a nossa natureza é ferida pelo pecado original e nos faz tender para aquilo que em si, não é bem, mas parece sê-lo para nós (o bem aparente que não é bem real).



Aceitar aquilo que entra em colisão com a nossa “vontade de potência”, que coincide com a “liberdade” absoluta ou melhor licença, aceitar os nossos limites, dizer sim a uma situação imprevista e não desejada que a vida nos apresenta, é isto, que o homem moderno, manchado pelo liberalismo, não sabe mais fazer e é por isto que não é mais verdadeiramente livre com a “liberdade dos filhos de Deus”. Gostaríamos de controlar tudo, como um “deus”, mas isto é impossível e as situações que não conseguimos “criar” segundo o nosso gosto tornam-se ocasião de desesperação e revolta. Ao invés, se soubessemos aceitar-lhe com os olhos da Fé, então seria ocasião de crescimento e de uniformidade a vontade de Deus.



Se conseguissemos aceitar uma realidade que a primeira vista parece negativa e pode ainda sê-lo em si e por si, mas que aceitada a luz de Deus e amada em Deus pode ser transmutada em qualquer coisa de boa, toda dificuldade se tornaria assunta a Deus. Posso aceitar me apesar dos meus limites, conaturais a minha natureza, porque sei que Deus me ama se eu O amo malgrado as minhas deficiências. Partindo do nada Deus criou o mundo, partindo das nossas misérias humanas, Deus pode produzir coisas esplêndidas como a santidade. Na aceitação daquilo que não gostamos é a Fé, a Esperança e o Amor em Deus que de cada mal tira um bem. Por exemplo, se sou pobre e digo sim a minha pobreza com Fé amorosa para Deus, a pobreza torna ocasião de santificação, como ocorreu a Jesus. Como se vê não é a realidade a determinar nos, mas o nosso modo de vê-la e aceitá-la com confiança ou recusá-la com revolta desesperada. A felicidade depende da nossa livre escolha, que, é feita segundo a ordem querida por Deus, é verdadeira e boa e leva a paz e a beatitude. O bom ladrão aceitou com amor a cruz e se salvou enquanto o mau ladrão a recusou, se revoltou, morreu desesperado e se danou. A mesma circunstância pode ser ocasião de felicidade ou infelicidade, segundo a vontade com a qual a vivemos. A parte principal depende de nós, sempre prevenidos e ajudados pela graça divina.



Os erros que se compreendem e se corrigem são o “adubo” que faz crescer o nosso espírito. Se ao invés nos obstinamos nesses e não queremos corrigi-los, permanecem “chorume” e o nosso espírito não cresce, mas si rotula na lama. “Errare humanum est, perseverare diabolicum”. Na segunda parte veremos a aceitação de si mesmo, como via para alcançar a paz de espírito.



d. CURZIO NITOGLIA



30 de março de 2012

http://www.doncurzionitoglia.com/pace_anima.htm

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Infelizmente, devido ao alto grau de estupidez, hostilidade e de ignorância de tantos "comentaristas" (e nossa falta de tempo para refutar tantas imbecilidades), os comentários estão temporariamente suspensos.

Contribuições positivas com boas informações via formulário serão benvindas!

Regras para postagem de comentários:
-
1) Comentários com conteúdo e linguagem ofensivos não serão postados.
-
2) Polêmicas desnecessárias, soberba desmedida e extremos de ignorância serão solenemente ignorados.
-
3) Ataque a mensagem, não o mensageiro - utilize argumentos lógicos (observe o item 1 acima).
-
4) Aguarde a moderação quando houver (pode demorar dias ou semanas). Não espere uma resposta imediata.
-
5) Seu comentário pode ser apagado discricionariamente a qualquer momento.
-
6) Lembre-se da Caridade ao postar comentários.
-
7) Grato por sua visita!

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.

Pesquisar: